sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Ordinary People



LX-418-Al S.Nicolau
O chiar da borracha humedecida e o som da ondulação a quebrar no cais, despertam os sentidos da minha alma. O cinzento do ar, confunde-se no triste verde da água, ilustrando o compasso da melancolia. O frio e escuro ferro das docas, fica para trás assim que os motores iniciam o rugido da sua fúria.
O vento que me acolhe, faz o meu cabelo esvoaçar, rasgando-me a face com subtileza. Os raios de luz já mal se vislumbram, por entre a penumbra das nuvens que se aproximam, e eu sigo sentado num qualquer lugar, cruzando o rio da ponte vermelha, aquela que lá ao fundo me completa a paisagem.
A espuma branca das ondas desvanece-se lentamente, traçando o rasto daquilo que é o meu percurso. Um caminho sinuoso e turbulento, que não dá sinal de acalmar. Por aqui as gaivotas estão sempre em terra .
Não sei por que linhas me tornarei, quando tão pouco sei aquilo que sou. Perco-me, confundo-me, transcendo-me. Encontro-me no meio de um remoinho de emoções, tal e qual aquele que o barco provoca ao atracar, mudando totalmente a direcção dos seres que por ali navegam.
A viagem acaba. As pessoas saiem. Mas eu fico.
Ainda não encontrei o meu porto.
Johnny*


domingo, 24 de outubro de 2010

(Another Broken) Promise

"Now sometimes the world tries to slap you
And it seems to love watching you fall
I wont lie to you, it's gonna happen
You got pick yourself up and move on"



Perdi a inocência do hálito fresco a mentol.
Experimentei o amargo do café.
Perdi a inocência da suave fragrância que transbordava da minha pele.
Substituí-a pelo odor negro do tabaco.
Cresci.
A minha vida mudou, e eu não fui capaz de contrariar essa mudança. Fui um espectador impotente, que assistia ao decorrer de mais um capítulo.
Não foi como eu quis. Não foi o que sonhei. Nada do que eu planejei. Vivi frustrações, falsas esperanças e sonhos perdidos. As ambições tantas vezes cantadas, ficaram noutra altura, presas pelo rude modo verbal "viver".
As vitórias alcançadas, não compensaram o amargo esforço dispendido nas derrotas atingidas.
Dei por mim noutro lugar, longe do quente aconchego que me ladeava os dias. Encontrei-me numa rua, na qual todos os dias passam as mesmas pessoas. As mesmas pessoas falsas e vazias. Uma rua onde não me consigo perder, pois não sei para onde caminho.
Não me encontro.
Vou tomando encruzilhadas novas todos os dias, pois nunca vivi em auto-estradas. A vida não é o que quero. Não é como quero. Não é quando quero.
Os planos são meio caminho percorrido para me deparar com o insucesso, com o inesperado.
Vou despir-me de desejos, preconceitos, expectativas e esperanças. Vou redesenhar-me da maneira mais egoísta e infantil possível, para não ser apanhado desprevenido, quando mais uma vez vir todas as minhas crenças, convicções e vontades caírem por terra, desmoronando mais facilmente que um castelo de cartas ao vento.
Vou ter menos do que nunca tive, fé.
Porque esta vida não é boa, nem sequer agradável, mas é a merda que me calhou.
Por isso vou conformar-me com existir. Todos os dias, apressando os segundos e os minutos.



Mais 24 horas.


"Promise me
You won't let them put out your fire
Put out your fire
Promise me
You won't let them put out your fire
Put out your fire..."



Johnny*

Carta

"Acredito e entendo que a estabilidade lógica de quem não quer explodir, faça bem ao escudo que és."

A minha vida é uma linha.
Branca, azul, verde e laranja.
A minha vida é uma linha que passa sem dar explicações, sem razão aparente ou motivo especial de existência.
Sou enquanto estou, tudo existe apenas por fracções de segundo, que se perdem no espaço. Esta linha, que apesar de recta, está longe de ser simples, confunde-se com tantas outras. Mistura-se num rodopio geométrico.
Os caminhos estreitos, curvos e sinuosos que ela atravessa, obriga-a pôr-se à prova todos os dias. A mostrar do que são feitos os valores e as convicções.
Esta linha aparentemente frágil e desprotegida, é mais forte do que eu, obrigando-me a mostrar o pior e o melhor de mim. O simples e o complexo.
Tão humilde, ténue e certa, dá origem aos sentimentos mais rebuscados e abstractos, dá forma e cor por onde atravessa. O seu carácter incisivo, faz com que ingenuamente pensemos que temos o poder de ajustar outras linhas tais como a nossa. Duas linhas sobrepostas, dão origem a uma só, invalidando-se.
O amor é impossível.
Só existe um, que sendo perpendicular, atravessa-nos uma vez, deixando-nos para trás, num piscar de olhos.
Nada é eterno. A enfermidade é mais que muita, e espreita a cada canto.
Parto então, apenas com lugar de origem.
Sem esperança. Sem pressa para conhecer a data, hora e local de chegada. Vou seguindo. Não sei bem como, não sei bem porquê.

Não existem rumos.

"Anseio o dia que acordares sobre todos os teus números, raízes quadradas, somas subtraidas, sempre com a mesma solução."

27 de Setembro 2010.

Johnny*